segunda-feira, 31 de outubro de 2011

A PONTE - por João da Mata Costa


A Ponte de Igapó atravessando o rio Potengi liga o litoral com o vale do Ceará Mirim, o Mato Grande e as Salinas com seus seios brancos e desnudos. A velha ponte, a verdadeira ponte da minha infância – a ponte de ferro com seus ferros entrelaçados – ligava mundos e sonhos. A travessia era one way e um carro precisava esperar o outro para atravessar a passarela num mugido de ferros e vãos. A velha ponte de ferro dos meus passos da infância está abandonada. Em outras terras ela seria preservada e ficaria como uma relíquia de um passado que teimam em apagar. A passarela muito estreitinha, às vezes a tábua movia, como eu sofria. Debaixo a água sorria. Algumas vezes precisei atravessar a ponte a pé transportando pacotes. Tinha muito medo, mas a obrigação gritava mais alto. Antes de chegar à ponte havia uma fila de casa populares construídas em cima de um lixeiro. Moradores conviviam com os urubus. Ligando as Quintas com o bairro de Igapó tinha a famosa corrente com um posto fiscal. Nesse lugar esperei muitas vezes o dinheiro que papai enviava do interior para mamãe. Ele fazia a famosa feira de Baixa Verde e fizemos muitas vezes o trajeto Natal – Baixa verde (atual João Câmara) de Jeep, caminhão, ônibus, trem ou qualquer outro meio de transporte. Após Ceará Mirim a estrada era de barro e a viagem ficava muito mais alargada nas horas que podiam passar contando jumentos.

A Velha Ponte da minha infância hoje é uma carcaça de ferro, desprezada e utilizada para emoldurar faixas de propagandas comerciais ou de políticos. Ela faz parte de um tempo, da minha história que ficou sem mais esse referencial sentimental. Algo assim como um corte que me impede de ir e vir atravessando o rio da minha infância. “Nunca nos banhamos duas vezes no mesmo rio, porque o rio não é o mesmo e homem muda”, disse Heráclito. Não atravesso o Potengi da mesma forma. No Potengi cresci, brinquei e me banhei. Dos trapiches dava bunda-canastra. Jogava bola nos mangues juntinho dos manguezais. Tempos que não voltam mais.

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