É moda prever o fim do livro, e é moda também dizer que o formato impresso é insuperável, que o cheiro do papel etc. fazem parte da experiência da leitura. Não tenho opinião sobre isso, mas observo uma coisa estranha.
Quanto mais falam que bom mesmo é o livro que você apalpa, dobra e cheira, mais aparecem invencionices no campo editorial.
Recebi agora um livro de Veronica Stigger, intitulado “Os anões”. O formato é compacto, bonito, com a capa naquele acabamento preto que os anúncios de celular e de laptop chamam de “steinway piano”, e com os cantos das páginas na bonita curvatura de uma carta de baralho, a exemplo da última edição de “Alice no País das Maravilhas”.
Muito bem. Você vai abrir o livro e, surpresa! Cada página é dura como um pau, plastificada, de modo que gruda na seguinte, e tem mais ou menos a espessura de um CD. Sinto-me como se tivesse voltado ao tempo em que a escrita era feita em tabletes de argila.
Qual a ideia, qual a justificativa dessa petrificação literária? Talvez tenha raiz num paradoxo. Já que a “materialidade” do livro deve ser valorizada diante de seus concorrentes eletrônicos, resolve-se fazer um livro bem “material”, sólido como um tijolo de baiano. Já que o livro é, antes de tudo, um “objeto”, faz-se o “livro-objeto”, o livro-peso de papel, o livro-enfeite, o livro-móbile, o livro-escultura...
Já vi livros sem capa, livros amarrados com barbante, livros com páginas de pano, livros com fibra de coco reciclada... Servem para dar de presente, e aliás é isso o que vem sustentando, imagino, parte da indústria editorial. Começou com os livrões de arte, livros contando a história da Ferrari ou com as 1000 bolsas Louis Vuitton que você deve comprar antes de morrer.
Agora, textos de literatura, de ficção, vão se embalando desse mesmo jeito; não que não possam ser lidos, mas o que importa é que sejam comprados, e quando você compra para não ler, é porque provavelmente comprou para dar de presente.
Escrito por Marcelo Coelho
Nenhum comentário:
Postar um comentário