terça-feira, 25 de setembro de 2012

Natal - Uma terra desolada Por João da Mata Costa


 
Os Sonhos dos candidatos
É dizer eleito estou
Faltar todas as promessas
Esquecer o que falou
É tirar lá no Planalto
Tudo que antes gastou

Antônio Lisboa – cantador RN

Tudo parece um cenário de ópera.  De uma ópera trágica onde nos somos os
bufões. O cenário é desolador. A cidade parece destruída por um tsunami.
Nada funciona. A saúde, a educação e a segurança.  A Micaela, personagem
célebre da opera Carmen de Bizet, se transforma em Natal na  Micaela
Merimee Micarla prefeita que venceu os poderosos (sic). O mocinho (Dom
José) que ajuda a princesinha a vencer o dragão perigoso de hoje é um
empresário/ político com muito dinheiro e força no governo que desenvolve
uma mise en scène. Os poderosos que apoiaram a princesinha saíram de cena.
Parece que ninguém ajudou a montar esse cenário desesperador. O saneamento
não veio. A praia cartão-postal da cidade virou pó.  O calçadão está
arrebentado. Derrubaram insanamente o Machadão. A cidade é suja. Feia. A
propaganda é falsa. Nenhum vereador é responsável por esse estado de
desolação. Meu cunhado foi correr no calçadão e tropeçou nas pedras
portuguesas. Fraturou ossos.
 A minha Ponta Negra está um lixo. Feia e fedorenta. Não, não tenho coragem
de tomar banho numa das mais belas praias do Brasil. No primeiro ano de
desgoverno, uma decoração natalina carnavalesca. Nenhum Secretário de
Cultura conseguiu fazer nada. O segundo ao ser criticado cunhou uma frase
que simboliza essa gestão: “estou cagando e andando”.

 No entreato da opera um show a preço de ouro do padre Fábio. Não tem
padre que consiga benzer esse descalabro.  Na plateia, nós - os bufões.
Os bobos da corte do reino do faz de conta. A Prefeitura de Natal é a
pior do Brasil.
Viva a democracia. Façamos valer o nosso voto nas próximas eleições. Os
atores desse teatro estão em cena e nos não podemos errar mais.  O povo
brasileiro precisa mostrar a sua força e indignação. Vamos reivindicar os
nossos direitos nas ruas, urnas e práticas republicanas. Vamos eleger
aqueles que cuidam dos bens públicos e formar uma polis, e colocar aqueles
que só se preocupam em enriquecer (os idiotas) no ralo dos esgotos que a
cidade de Natal não tem. Enterremos definitivamente os coronéis da
politica e aqueles que só prometem em tempos de eleições.  Não troque o
seu voto (sua maior força) por nada. A politica é necessária e nem todos
os políticos são iguais.

quinta-feira, 13 de setembro de 2012


Foi um pedido de Abimael Silva a edição fac-similar do ensaio de Jackson de Figueiredo que há algumas décadas cochila à sombra silenciosa desta pequena caverna de livros. Como pediu um texto para contar um pouco da fortuna crítica de Auta de Souza que, no século passado e até hoje, é a maior e mais rica da nossa literatura. Uma estrela no firmamento poético da província.

A fortuna de Auta
                                                                   Vicente Serejo             

Horto é a história de uma grande dor.  Henrique Castriciano                                           
                                              
Auta de Souza não viveu no século vinte. Apenas um mês e sete dias, em 1901. O que lhe restava de vida nada mais foi do que os instantes finais da tuberculose que consumiu quase sua vida inteira. Viu o Horto sair dos prelos de A República com o prefácio de Olavo Bilac, e depois morreu.
Conviveu com a poesia, desde antes da adolescência, quando já ensaiava versos nos jornais da cidade, por influência dos irmãos Eloy de Souza e Henrique Castriciano. E, mesmo assim, não viu a glória. Feneceu sem ouvir o aplauso dos críticos literários mais consagrados do século passado.
A peste branca, a tuberculose, o mal que abria cavernas nos pulmões, deu o primeiro sinal ela ainda jovem, aluna do Colégio São Vicente, das irmãs francesas, no Recife velho. Uma hemoptise roubou sua alegria de viver, proibiu seu único amor e a fez triste, triste, de nunca mais ser feliz.
Auta Henriqueta de Souza nasceu em Macaíba a 9 de setembro de 1876 e fechou seus olhos para sempre na madrugada do dia 7 de fevereiro de 1901. Padre João Maria, o santo da cidade, deu-lhe a extrema unção, e o governador Pedro Velho, na cerimônia de adeus, beijou-lhe a testa sem vida.
Tinha 25 anos e esvaiu-se em versos para usar a expressão de Edgar Barbosa, prefaciador de Vida Breve de Auta de Souza, biografia, quase um poema em prosa, que Câmara Cascudo escreveu. Logo ele que, ao nascer, foi embalado nos braços tépidos da poetisa mística, amiga de sua mãe.
O prefácio de Olavo Bilac, príncipe dos poetas brasileiros, tem uma explicação: era amigo de Henrique. É tanto que a seu pedido, em carta que anos depois o poeta de Ruínas publicaria na Revista do Brasil, fundou os escoteiros no Rio Grande do Norte. Um aplauso discreto, mas consagrador.
A singela edição provinciana do Horto não bastava para a consagração nacional. Convencido de que era preciso levá-lo aos olhos dos grandes críticos, Henrique faz a nova edição em Paris, uma co-edição da Aillaud-Francisco Alves que saiu dos prelos de uma tipografia instalada no número 96 do Boulevard Montparnasse, em 1910, exatos dez anos depois de publicado e da morte de Auta.
Mas Henrique cuidou de manter tudo como na edição original. O prefácio de Olavo Bilac, as epígrafes de Edmundo de Amicis e os versos de Castro Alves. A dedicatória aos pais e às irmãs francesas do Colégio São Vicente, em Estância, gratidão às ‘formosas santas’, educadoras do seu espírito, além de uma revisão mais rigorosa do conjunto de poemas.
A nova edição ganha um tamanho menor, mais moderno, em capa verde, a efígie de Auta, em bico de pena, e ilustrações de D. O. Widhopff. Para fixar os traços de sua vida e do seu retrato literário, Henrique acrescentou o que chamou de ‘Nota’. Um posfácio indispensável para contar a história daquela poetisa ao mundo intelectual do Rio e São Paulo.
Ainda não será em 1903 nos Poetas Brasileiros Contemporâneos, seleção de Mello Moraes Filho, a primeira luz sobre Auta de Souza. Nem será em 1907, no Parnaso Brasileiro, de Afonso Costa. Mas em ambos há a presença de Henrique Castriciano, nosso único poeta nacional.
O efeito da nova edição e de sua circulação nacional, se registra menos de um ano depois, em meados de 1911. Nestor Vítor dedica um ensaio de quase doze páginas ao Horto, depois incluído no volume Os de Ontem. Classifica de ‘individualidade interessante’ a poesia de Auta e cita ‘a sóbria e comovente nota’ de Henrique para concordar com a influência de Marceline de Walmore.
É a também a edição francesa que vai impressionar fortemente ao então mais consagrado dos críticos católicos brasileiros, aquele que depois da conversão vai organizar o Movimento Católico Leigo do Brasil e a quem Alceu do Amoroso Lima, Tristão de Athayde, irá substituir à frente do Centro D. Vital depois de sua morte trágica: Jackson de Figueiredo.


Não é à toa que ele escolhe a poesia de Auta de Souza para, em 1924, ser o ensaio de abertura da série ensaística que anuncia como o roteiro da poesia cristã no Brasil.
Em 1936 - vinte e seis anos depois - sai a maior edição do Horto como tiragem, e aquela que manterá aceso o nome de Auta durante trinta e quatro anos, até a edição da Fundação José Augusto, em 1970. É a terceira edição, Typographia Batista de Souza, Rio, e incorpora ao seu acervo de textos consagradores o prefácio de Alceu Amoroso Lima. É ele vai buscar em Jackson a certeza de que o Horto eleva Auta de Souza à condição de maior nome da poesia mística no Brasil.
Nos últimos anos a Universidade Federal do Rio Grande do Norte lançou duas novas edições do Horto, a sétima destinada a promover o acesso aos estudantes em razão da inclusão da poesia de Auta no programa do vestibular em 2009. Ambas com a longa e erudita introdução da professora Ana Laudelina Gomes, autora de uma tese de mestrado sobre a poetisa de Horto.
É este ensaio de Jackson de Figueiredo, raridade bibliográfica desde o final dos anos vinte, que o editor Abimael Silva devolve aos olhos dos leitores contemporâneos oitenta e oito anos depois de brilhar em plena efervescência estética do Movimento Modernista de 22.

domingo, 9 de setembro de 2012

Uma razão a mais para escrever... Por Lívio Oliveira

 
 Na semana passada estive na casa de um jovem chamado Thiago Gonzaga, na Cidade da Esperança, nesta Capital ensolarada. O nome do bairro não poderia ser mais expressivo para aquele momento e a visita me trouxe algumas fortes emoções que ora quero compartilhar com os meus poucos (mas, muito especiais) leitores.

Thiago Gonzaga é um jovem e simples trabalhador da Companhia de Limpeza Urbana de Natal. Exerce a difícil e nobre função de gari. Com o trabalho, vem pagando seus estudos e já é graduado por uma universidade particular e pretende, logo, fazer uma pós-graduação em Letras. Acontece que – até ter completado 23 anos de idade – Thiago sequer havia concluído o primeiro grau, em face das poucas condições econômicas de seus familiares, daí decorrendo a necessidade de começar a trabalhar bem cedo.

Como o nosso amigo Thiago retornou aos estudos? Talvez essa pergunta já esteja fervilhando na cabeça dos leitores. E a resposta vem das palavras do próprio jovem trabalhador: "- Olha, Lívio, a literatura potiguar teve e tem uma importância  muito grande pra mim. Foi praticamente através dela que eu me alfabetizei de verdade. Depois, prossegui com a educação formal...".

Thiago é, hoje, um dos poucos e dedicados pesquisadores (quase que exclusivamente, do ponto de vista da temática) acerca das obras literárias dos autores potiguares. Inclusive, tive a oportunidade de conhecer - nessa visita que lhe fiz - a sua biblioteca, quase toda formada por itens da literatura potiguar e que o rapaz compartilha com a comunidade de seu bairro e diversos estudantes e estudiosos da cidade.
E Thiago também já é autor. Recentemente, prestou rica homenagem em um livro que organizou (juntamente com Fátima Lina Lopes e Chumbo Pinheiro, este também gari) dedicado a Nei Leandro de Castro, por ocasião dos seus cinquenta anos de produção literária. Se eu fosse Nei, teria por esse pessoal uma gratidão eterna!

Vale lembrar que Thiago vem preparando outros estudos e trabalhos sobre autores de nossa terra, os quais homenageará com suas pesquisas. Inclusive, confessou-me Thiago – para minha profunda satisfação – que começou a formar mais sistematicamente a sua biblioteca quando leu o meu livro "Bibliotecas Vivas do Rio Grande do Norte", obra esgotada e que publiquei na Editora Sebo Vermelho, de Abimael Silva, no ano de 2005.
A visita que fiz a esse jovem gari, que se transformou em estudioso e pesquisador das letras, fez-me renovar os melhores sentimentos quanto ao labor singelo que é desempenhado por nós, os escritores do Rio Grande do Norte, praticamente obscuros no contexto nacional (com poucas exceções), mas com uma bela missão a cumprir diante do nosso povo e da nossa querida província.

Muito obrigado, Thiago, por tudo! E prossiga, com altivez, no seu digno papel cultural!

Mário de Andrade e o Nordeste Por João da Mata Costa



No final do ano de 1928, Mário de Andrade visitou o Rio Grande do Norte e
levou o canto e encanto de Chico Antônio para o mundo. “Já estou no RN,
pertencendo ao meu amigo Luís da Câmara Cascudo, e o prazer vai enfeitando
o presepe. Mario fica encantado ao passar por Natal. Me deito depois desse
primeiro dia  de Natal. Estou que nem posso dormir de felicidade. Me entro
na cama e o vento vem, bate em mim cantando feito coqueiro. Pois aqui
chamam de “coqueiro” cantador de cocos. Não se trata de vegetal, não, se
trata do homem mais cantador desse mundo: nordestino. O vento de Natal é
mano dele ... Na noite de Natal, em Natal, Mario assiste a um pastoril de
meninas e um Diana caçadora sem nenhuma Grécia. - a população se deslocou
do Tirol e da Solidão, bairros vizinhos. Os bondes, os autos , as “
dondocas” ( ônibus) vêm cheios. Gente de branco, gente de encarnado, der
azul, moças bonitas ... Junto das barracas do América e do A.B.C, clubes
de futebol, a rapaziada faz um sarceiro gostoso, cantando cocos... “ Oh
mulé, sai do sereno, / Que essa frieza faz mal ... ”.
O relato dessa viagem foi publicado em o Turista Aprendiz.  Em Janeiro
Mário conhece Chico Antônio, que para ele vale uma dúzia de Carusos. “ ai
seu dotô / quando chegar em sua terra/ vá dizer que Chico Antonio/ É
danado pra embolá!” Oh-li-li-ô! Boi Tungão / Boi do Maiorá ...´´. Estou
divinizado por uma das comoções mais formidáveis da minha vida. Chico
Antônio. cantava a noite inteira por uma cachaça, por coisa nenhuma e
passa a noite inteira cantando sem parada. “Que artista. A voz dele é
quente e de uma simpatia incomparável... “ Homem bonito e forte já
estragado com seus 27 anos e muita cachaça. Mário desejou morar em Natal e
encantou-se com as nossas belezas naturais e culturais. O Boi, os catimbós
e as músicas de feitiçaria. Um missivista contumaz travou intensa e
importante correspondência com Câmara Cascudo, organizada incialmente por
Veríssimo de Melo.
Dez anos depois, Mario de Andrade trabalhava no Departamento Municipal de
Cultura de São Paulo. Sob a gestão de Mário foi enviada uma equipe para
coletar a música folclórica do Brasil. Essa viagem etnográfica foi pensada
desde 1926 e tinha por objetivo colher informações do rico repositório
etnográfico que é o nordeste brasileiro.  Por questões políticas Mario foi
afastado do Departamento de Cultura de SP, mas o projeto foi retomado pela
grande pesquisadora Oneyda Alvarenga, que passou 30 anos organizando esse
material coletado. O Xangô e outros cultos afros eram proibidos em vários
estados. Mesmo assim eles conseguiram registrar cerimônia de Xangô, em
Pernambuco, e macumba no Maranhão. Nessa missão foram recolhidos: Canto de
Trabalho, músicas de rezar, cantar e dançar. Um rico material produzido e
idealizado por esse grande brasileiro que sabia valorizar a nossa rica
cultura. Não fosse essa missão muita coisa teria sido perdida. Felizmente
parte desse material foi recuperado e lançado numa caixa de CDs para a
posteridade. Ficamos conhecendo mais o Brasil e suas ricas manifestações
culturais, graças a esse rico projeto que teve na pesquisadora Oneyda a
sua materialização para a posteridade. 
 
na foto: Mário de Andrade (de óculos) em 1936,
entre Cândido Portinari, Antônio Bento e Rodrigo Melo Franco