quinta-feira, 12 de dezembro de 2013

Uma paixão desenfreada pelo Seridó, Seridós...

Seridó, Seridós, é uma edição do Sebo Vermelho, reunindo crônicas de Moacy Cirne, verdadeira epifania ao sertão onde nasceu e descobriu o mundo. O poeta, o cronista e memorialista se encontram e se reencontram em deliciosos textos. O insuperável sabor da terra. Se o francês tinha suas madeleines, o seridoense vai buscar suas lembranças nas bolachas regalias. As orelhas do livro já seguram o leitor na primeira linha, bem antes da primeira curva:

“MOATIDATOTATÍRNE, como se autodenominava quando criança, viajou pelas planícies brancas de Marte antes de anoitecer em nosso planeta. Nascido na Caatinga Grande das terras seridoenses, conheceu o mundo do ano de ‘Dia de ira’(Dreyer) e ‘Perto do coração selvagem’ (Clarice Lispector), além de ‘O ser e o nada’(Sartre). Admirador de Guimarães Rosa, Oswald de Andrade, Graciliano Ramos e Moysés Sesyon, adora caldo de cana com pão doce. Criticado por muitos e elogiado por alguns poucos, sobretudo os amigos, MtT é um despoeta do cangaço anticulturalcontramemorialistico.”

Mais adiante se confessa um ateu militante e se declara leitor da Bíblia e dos quadrinhos eróticos de Milo Manara. 

Faz outras confissões: “Devoto de Nossa Senhora de Sant’Ana, São Castilho e São Nelson Rodrigues”, estes dois últimos certamente por conta do Fluminense, sua outra grande e incontrolável paixão. Olhando para o Itans, Moacy Cirne faz nova confissão: “Gostaria de ter escrito o Pentateuco”. Ou, então, os livros de Oswaldo Lamartine”.

Apaixonado também pelo cinema, frequentador do cine Pax, de seu Clóvis, Moacy vai debulhando suas lembranças pelas ruas de  sua cidade:

“Quando criança, nas ruas empoeiradas de Caicó dos anos 40 e 50, ruas essas bordadas com os sentimentos das descobertas intangíveis, eu me perguntava: Será que a bela Esther Williams um dia sairia das piscinas do cinema de seu Seu Clóvis para visitar meus sonhos mais delirantes? Será que  a estonteante Ava Gardner um dia, quem sabe, abandonaria os braços de Frank Sinatra para ser acolhida pelos meus abraços e pelos meus delírios?”

Da Coluna de Woden Madruga na Tribuna do Norte

Seridó, Seridós será lançado sábado, 14, a partir das 9 horas, no Sebo Vermelho, da avenida Rio Branco, 705 (onde foi Gumercindo Saraiva), Cidade Alta.

segunda-feira, 18 de novembro de 2013

Morre o chargista Antonio Amâncio. Ele foi um dos primeiros a denunciar as mazelas da nossa desgovernadora. Seu genial sarcasmo fará muita falta por aqui. RIP, Amâncio.


A imprensa norte-rio-grandense perdeu hoje um dos seus talentos gráficos mais combativos, o chargista Antonio Amâncio, vítima de um acidente automobilístico sofrido durante o feriadão, quando iria visitar a família em Macau. 

Durante meu tempo de redação, nunca tive a oportunidade de trabalhar com Amâncio. Conheci-o durante o lançamento de uma coletânea de suas obras, no Bardallo's, que rendeu um papo ligeiro, mas agradável. Quem era da sua lista de amigos neste facebook com certeza deve ter recebido inúmeras mensagens privadas pedindo para curtir/compartilhar suas charges sempre que ele as postava por aqui.

Amâncio não tinha um traço muito sofisticado (apesar de um ser um bom caricaturista) e nem sempre a execução da ideia em suas charges alcançava a sutileza dos mestres nesse ofício, porém possuía uma característica que o destacava, de longe, de seus colegas na imprensa potiguar: o caráter predominantemente político de suas charges. 

Certamente pelo seu intenso envolvimento com o sindicalismo, Amâncio invariavelmente direcionava seus ataques para os donos do poder, dando nome e cara (feia) aos bois. Poucos entenderam, no RN, o sentido original do termo 'charge' como gênero jornalístico. E falar de poder, aliás, contra o poder no Rio Grande do Norte não é tarefa pequena nem fácil. 

O fato de uma destas charges ter motivado sua saída da Tribuna do Norte só aumenta e valoriza sua biografia profissional - além de diminuir a do jornal e a do casal de pistoleiros do Oeste que tomaram de assalto o Governo do Estado. 

Não pensem que tal mesquinharia é exclusividade dos provincianos mossoroenses. Testemunhei certa vez um colega chargista ser proibido de retratar a ex-governadora Wilma de Faria e seu esfuziante penteado laqueado, depois que ela telefonou para o diretor do veículo e reclamou da sua feiura exterior (como se a interior já não bastasse).

Por ironia do mercado e demonstrando as incongruências desse cruel jornalismo tribal a que estamos submetidos, Amâncio encerrou sua carreira como chargista do Jornal de Hoje, um noticioso comumente achincalhado pelos livres-pensadores da terrinha por sua subserviência a "quem pagar mais", mas onde diariamente ele podia fazer o que sabia como poucos: bater em quem merece. 

Valeu, Amâncio. Pelo exemplo. Pela luta. Alex de Souza

http://g1.globo.com/rn/rio-grande-do-norte/noticia/2013/11/morre-chargista-antonio-amancio-vitima-de-acidente-na-br-406-no-rn.html


sexta-feira, 30 de agosto de 2013

Uma Aventura na África... um retrato de Angola.. Lançamento em Breve!!

  
Especial é pouco. Sinto-me inteiramente privilegiada em falar sobre o autor deste livro, a quem tenho orgulho de ser admiradora, filha e amar incondicionalmente, assim como versar um pouco sobre esta obra, que se trata de um projeto antigo, escrito anos atrás sem grandes intenções para publicação.
    No entanto, diante de uma leitura agradável que prende a atenção do leitor, que tem interesse em saber cada vez mais sobre o que se passa numa vida tão distinta da nossa, em termos culturais, senti-me na obrigação de colocar este projeto para frente.
    Dar ao meu pai e ao seu escrito o devido valor e fazer com que esta obra siga para mãos curiosas, olhos ávidos pelo conhecimento, olhos com olhar dedicado ao coração, sentimento que de fato apresenta-se em algumas histórias desta obra.
    São relatos de acontecimentos, uns tristes, outros nem tanto e alguns te fará sorrir incansavelmente. Você vai se divertir com a leitura e também se emocionar.
    A respeito do autor, os ossos do ofício o deixou por muito tempo distante de sua família, privando-o, assim, de comemorações importantes e momentos únicos. Porém, isso o fortaleceu e fez dele o mais especial dos homens para nossa família, pois mesmo ausente estava sempre presente em nossas lembranças e corações.
    Guerreiro em sua batalha, dedicado ao trabalho e ao conhecimento, pessoa de fácil convívio, ele superou todas as adversidades que encontrou em seu caminho, nessa jornada de um ano que passou na África. Esse período, mais pareceu uma vida inteira, com direito a fazer amigos, se auto-conhecer, conviver com as diferenças e as semelhanças e até superar a perversa malária.
    Francisco de Assis, Chico ou Chicão, como é chamado pelos amigos, é autor do livro Campeões de Causos (1988), em que relata histórias pitorescas do cotidiano. Porém, em seu arquivo pessoal já conta com alguns livros escritos e esperando futuras publicações.
    Entre eles, há um grande romance que se passa na Cidade do Natal e uma outra obra totalmente poética, com poesias escritas nos tempos idos, quando ainda mais jovem. Logo, você, leitor, terá a oportunidade de apreciá-los tão quanto fará com este.
    A África é realmente um lugar mágico. Então, tenha uma boa leitura e aprenda um pouco mais sobre sentimento, aquela sensibilidade que só vem do coração.


Cecília Otaviano Cavalcante de Assis


quinta-feira, 15 de agosto de 2013

Na Tal Cidade do Humor... Um brinde ao riso por Cellina Muniz


Além de sua escrita peculiar e rara, o que mais impressiona nestes escritos de Cellina Muniz é sua relação com a produção cultural local. Esta marca estava já em trabalhos anteriores (até mesmo em sua tese de doutorado, “A experiência pedagógica de uma escritura dionisíaca”, em que analisa as práticas de escrita de fanzines e revistas alternativas de um grupo da capital cearense) e reaparece com força neste novo conjunto de artigos. Na tal cidade do humor tanto mostra o viés acadêmico dos trabalhos de Cellina (e que eles não precisam ser solenes) quanto sua relação densa com a cidade (Natal agora, Fortaleza antes), especialmente pela relação com tipos que, na falta de termo melhor, se chamariam populares. Também porque me interessam estudos do humor, saúdo mais este livro de Cellina.
                                                                            SírioPossenti (IEL/UNICAMP)

Nascida em Brasília-DF mas cearense de pai, mãe, criação e coração. Mora atualmente em Natal, onde trabalha como professora adjunta do Departamento de Letras e do Programa de Pós-Graduação em Estudos da Linguagem da UFRN. Publicou também Nietzscheanismos (Fortaleza, UFC, 2008), Fanzines: autoria, subjetividade e invenção de si (Fortaleza, UFC, 2010) e O Livro de Contos de Alice N. (Natal, Sebo Vermelho, 2012).

cellina.muniz@bol.com.br
www.escritosdealicen.blogspot.com

quinta-feira, 4 de julho de 2013

Suspense, Polêmica e Mistérios nos Crimes do Padre Heusz



A história da história
O personagem foi criado dia 1º de outubro de 2010, uma sexta-feira. A princípio a história do Padre Heusz seria publicada em capítulos no blog Coisas de Jornal, mantido pelo autor. Ficou só na intenção. Após a publicação do primeiro capítulo o autor esqueceu o personagem para somente resgatá-lo em 2013. Tomando a decisão de transformar a ideia em livro este foi redigido em cerca de três meses, uma vez que o Barreto somente tinha tempo à noite, após as aulas na UFRN. “Os crimes do Padre Heusz” é um mergulho profundo na condição humana, seus equívocos, tragédias, desvãos e deslizes. É a cifra da busca humana pela redenção ante a perplexidade advinda da finitude do estar vivo. A isso se alia a prática da vida como pecado, a vida como instância de culpa e busca desesperada do divino pelo pecador/culpado. “Os crimes...” é também, à sua maneira, um romance policial e, com alguma licença, um livro de aventuras. Por mais terríveis que estas sejam.

Sobre o autor

BARRETO é jornalista há 38 anos. Doutor em Ciências Sociais. Começou no Diário de Natal como repórter de polícia recebendo as primeiras letras de Alexis Fernandes Gurgel, louco sublime. Ingressou no jornalismo após ser submetido a teste de datilografia e conhecimentos gerais por Luis Maria Alves, O Coroa, lendário superintendente dos Associados no RN. Depois trabalhou na Tribuna do Norte, A República, semanário Dois Pontos, TV Ponta Negra. Foi correspondente da revista Visão. Atualmente é professor do curso de Jornalismo da UFRN onde ministra Jornalismo Impresso, Oficina de Texto III e Reportagem, Pesquisa e Entrevista. Apresenta e dirige o programa de entrevistas Grandes Temas, na TV Universitária. Na mesma TV criou e apresentou por dois anos o programa Xeque-Mate, de entrevistas. Publicou Crônicas para Natal e Memória do Comércio do Rio Grande Norte, livro-reportagem. Mantém o blog Coisas de Jornal. Tem artigos sobre jornalismo e comunicação publicados em revistas acadêmicas nacionais e internacionais. Faria tudo outra vez.

PS: o autor acredita em Deus, quer bem a Nossa Senhora e tem medo de lobisomem; isso é bom para a alma, conforme ensinamentos recebidos de Luis da Câmara Cascudo.  




“Emanoel Barreto é um dos melhores redatores da minha geração naquele velho e inesquecível Diário de Natal, o outro. É o excelente contador de histórias que vem aí. Com e velhíssima leveza que fez dele uma presença talentosa e querida na história contemporânea do jornalismo aldeão.”
                                            Vicente Serejo – Cena Urbana – O Jornal de Hoje

“‘Os crimes do Padre Heusz’: a obra trata, em meio ao suspense em que foi construída, da questão da condição humana.”
                                                                      Mário Gerson – Gazeta do Oeste


“O romance é uma sucessão de acontecimentos bizarros e terríveis situações, com os personagens levados ao limite da condição humana. Tudo se passando em meio a momentos de terror e a um final absolutamente inesperado.”
                                                                                                               Jornal de Fato

“A obra trata da questão da condição humana, da queda, das incertezas e questionamentos entre os conceitos do Bem e do Mal.”
                                                                                                     O Mossoroense

Recebo informação sobre o romance “Os crimes do Padre Heusz”, livro do grande jornalista Emanoel Barret. O livro conta a história do Padre Heusz que toma ao pé da letra a assertiva bíblica “o salário do pecado é a morte” e pune os pecadores com hóstias envenenadas. Com certeza um grande livro a considerar que Emanoel Barreto tem um dos melhores textos que eu conheço.”                                                                
Gilberto de Sousa – Circulando em Off – Gazeta do Oeste

domingo, 30 de junho de 2013

Três momentos dentro do cangaço

ReproduçãoLampeão: Sua História, de Érico de AlmeidaLampeão: Sua História, de Érico de Almeida
A figura controversa do cangaceiro Virgolino ‘Lampião’ Ferreira, Virgolino (1898-1938) com “o” que é a maneira correta de grafar o nome verdadeiro do mais famoso e temido dos anti-heróis brasileiros de acordo com a página eletrônica (infonet.com.br/lampiao) mantida pela neta do cangaceiro Vera Ferreira, permeia os três novos lançamentos da Sebo Vermelho Edições agendados para este  próximo sábado (29), das 9h às 12h, no próprio sebo na Av. Rio Branco – Centro.

“Quem é quem no cangaço”, de Paulo Medeiros Gastão; “O Cabeleira”, de Franklin Távora; e “Lampeão – sua história”, primeira biografia sobre o cangaceiro escrita em 1926 pelo paraibano Érico de Almeida, fazem parte da Coleção João Nicodemos de Lima que chega ao volume 378. “É mais uma raridade da bibliografia do cangaço que o Sebo Vermelho reedita em edição fac-similar, para conhecimento das novas gerações”, comentou Abimael Silva sobre a biografia pioneira escrita mais de uma década antes da morte de Lampião (com “i”, segundo Vera Ferreira).

Escritor e jornalista, Érico de Almeida escreveu 14 capítulos sobre a presença de Lampião na Paraíba, Pernambuco, Ceará e Alagoas; sendo o último capítulo um depoimento do também cangaceiro Antônio Silvino (1875-1944) sobre Lampião.

ReproduçãoQuem É Quem No Cangaço, de Paulo Medeiros GastãoQuem É Quem No Cangaço, de Paulo Medeiros Gastão
Já “Quem é quem no cangaço”, do pernambucano Paulo Medeiros Gastão, 74, trata-se de uma obra referência que funciona como ponto de partida para quem quer conhecer a ‘literatura cangaceira’. O livro, originalmente publicado em 2012, traz uma vasta lista com nomes de autores de todo o Brasil que abordaram o tema em várias épocas – os potiguares Lauro da Escóssia, Juvenal Lamartine, Câmara Cascudo e Iaperi Araújo são alguns dos citados na obra.

ReproduçãoO Cabeleira, de Franklin TávoraO Cabeleira, de Franklin Távora
Enquanto “O Cabeleira”, editado pela primeira vez em 1876 e que também vem em versão fac-símile, traz o cangaço para o universo urbano. Contemporâneo de Visconde de Taunay, José de Alencar, Machado de Assis e Joaquim Manoel de Macedo, o cearense Franklin Távora (1842-1888) foi um dos pioneiros do chamado romance regionalista com este romance. O livro, o primeiro registro da literatura brasileira a ter um cangaceiro como personagem central, narra as aventuras e desventuras do cangaceiro José Gomes na cidade do Recife do século 18.

“Ótima leitura para quem aprecia, detesta ou espreita o cangaço”, garante o sebista e editor Abimael Silva.

Serviço: Lançamento dos livros “Quem é quem no cangaço” (R$ 30), de Paulo Medeiros Gastão; “O Cabeleira” (R$ 25), de Franklin Távora; e “Lampeão – sua história” (R$ 25), de Érico de Almeida. Sábado (29), das 9h às 12h, no Sebo Vermelho – Av. Rio Branco, 705, Cidade Alta.
 Fonte: Tribuna do Norte ---- www.tribunadonorte.com.br

domingo, 16 de junho de 2013

Um Rio Grande do Norte a ser descoberto, um livro importantíssimo da literatura do RN, redescobereto pelo Sebo Vermelho. Apresentação do Jornalista Vicente Serejo









Há vários anos dorme numa destas estantes um exemplar, não autografado, de um livreto tamanho opúsculo que reúne nas suas trinta e uma páginas o texto ‘Aspectos Norte-Riograndenses, dados e informações’, além de tabelas e quadros em folhas não numeradas. É a conferência que Domingos Barros leu na noite de 9 de dezembro de 1908, no salão do Museu Comercial, no Rio, representando o Rio Grande do Norte na Exposição Nacional das riquezas econômicas do Brasil.
            Durante muito tempo, calado e sem pressa, segui os seus passos. Vi a publicação na revista do Instituto Histórico - tem aqui a coleção completa - quatro capítulos em A República, de 28 a 31 de dezembro de 1909, o mesmo ano da publicação autônoma e por uma indicação do historiador Olavo de Medeiros Filho. Anotei sua publicação original no Jornal do Comércio, do Rio, além de informações também preciosas que devo a Willian Pinheiro, pesquisador seridoense de olhar certeiro e aguçado.
            A grande luz que alumiou a figura singular de Domingos Barros foi Manoel Dantas, mas ficou na primeira década do século passado. Tanto que, em setembro de 2006, o jornalista Woden Madruga confessou ter lido pela primeira vez o nome de Domingos Barros numa citação do livro do francês Paul Walle. Há no Instituto Histórico um exemplar autografado da edição francesa, original de 1910 - hoje traduzido por Oswaldo Biato e lançado pelo Senado Federal depois de publicado há quase um século.  
É forte sua presença na forma de citações em Tavares de Lyra, principalmente no ensaio ‘O Rio Grande do Norte’, de 1912, que também vive aqui, ao lado de sua História, esta de 1921. E no ‘Memória do Livro Potiguar’, de Manoel Rodrigues de Melo. Paul Walle elogia a cultura de Barros no capítulo que dedica ao Estado em seu livro de viagem ‘No Brasil, do Rio São Francisco ao Amazonas’, a quem classifica como um homem verdadeiramente sábio e erudito com raro conhecimento do Brasil.
            Foi de Domingos Barros a primeira percepção motivadora para vender a riqueza econômica do Estado no cenário nacional. A sala da exposição do Rio Grande do Norte, no Palácio do Comércio, no Rio, atraiu a atenção do presidente Afonso Pena e de dois dos seus ministros. Registra a edição de 8 de outubro de 1908 de O Paiz: ‘Foram demoradamente examinadas por Sua Excelência - o presidente Afonso Pena - com especial atenção, a exposição da Companhia Sal e Navegação e os diapositivos estereoscópicos do Dr. Domingos de Barros, tendo sido as mais entusiastas e lisonjeiras as referências de Sua Excelência a uma e outra’.
            Depois da repercussão da conferência impressa na Tipografia Jornal do Comercio, Rio, 1908, e que teve também na platéia a presença ilustre de ministros, o norte-rio-grandense Tavares de Lyra, ministro do Interior e Justiça, e Miguel Calmon, de Viação e Obras; e do então deputado federal Eloy de Souza, sua segunda consagração aconteceu em Natal. Manuel Dantas anuncia a transcrição em A República depois do sucesso nas páginas do Jornal do Commercio, do Rio. É saudado efusivamente pelo próprio Manoel Dantas, com o pseudônimo de Braz Contente, por ter sido merecedor ‘do elogio unânime da imprensa fluminense’.
            Domingos, a rigor, não era totalmente um estrangeiro na Natal do início do século vinte. Ao contrário. Casado com Leonor, filha de Fabrício Gomes de Albuquerque Maranhão, era sobrinha de Pedro Velho, Augusto Severo e Alberto Maranhão.  
            Ele estava no então Teatro Carlos Gomes, como noticia A República de 31 de janeiro de 1909, na reunião com o governador Alberto Maranhão, quando um grupo de amigos aprovou a campanha de aquisição de uma casa para a viúva e os filhos do poeta Segundo Wanderley; a edição de suas obras poéticas e o planejamento daquele que seria o evento cultural mais importante na década de abertura do Século XX: as conferências de Manuel Dantas, Eloy de Souza, Domingos Barros, Honório Carrilho e Henrique Castriciano promovidas pelo pequeno e sempre bem humorado jornal literário O Bloco. Eloy abriu com os Costumes Locais e Manuel Dantas com sua célebre visão de uma Natal futurista.
            A conferência de 1908, de Domingos Barros, é a demonstração do seu espírito empreendedor, razão da inveja provinciana da qual acabaria vítima. É a primeira visão grande-angular da economia do Rio Grande do Norte e os benefícios, se exploradas corretamente, para as futuras conquistas sociais. E revela, em seu levantamento surpreendente, nossos rebanhos bovinos e caprinos, a produção de açúcar, cera de carnaúba, algodão, sal marinho, borracha de maniçoba e mangaba, e as pequenas lavouras. Em cada região e com suas especificidades, agrupando produtos e produtores nos espaços e ao longo dos textos e quadros elaborados pelo seu talento observador.
           



Sua sensibilidade não se volta apenas para a economia. Impressiona vivamente sua descrição da vaqueirice no sertão: ‘No entanto o mister do sertanejo é árduo e penoso e reclama uma alma forte e varonil, aliada à grande destreza e robustez física’. E logo a seguir: ‘Vaqueiro no sertão só o é o sertanejo, porque a lide do gado é muito diversa da dos campos do sul’. E descreve o sertão: ‘Há poucos descampados. O aspecto geral é a caatinga, espécie de floresta baixa, intrincada e espessa, onde predominam as plantas espinhosas, a jurema, a favela, o xique-xique e o mandacaru’.  E narra essa luta dos homens e dos bichos numa orquestração de gestos e ritmos na aspereza da caatinga.
            A orfandade pobre impediu Domingos Barros de concluir, já no quarto ano, seu curso de medicina, mas conseguiu aprofundar seus conhecimentos de química. Ao lado de Vale de Miranda, o inventor da Sanarina, produziu o sal de qualidade aqui no Estado para o mercado da carne de charque no Rio Grande do Sul, e instalou o sistema de iluminação do Teatro Carlos Gomes a gás acetileno. Um desafio que uniu seu talento ao de Vale de Miranda e os credenciou para a construção do sistema de iluminação da cidade. Sonhou com ferrovias, indústrias, invenções.
Foi um entusiasta da Aeronáutica Brasileira e com esse título reuniu os três ensaios biográficos sobre Bartolomeu de Gusmão, Santos Dumont e Augusto Severo, como narra Augusto Fernandes no capítulo onze do seu livro ‘O Pioneiro Esquecido’. Domingos nasceu em Garanhuns, Pernambuco, a 4 de março de 1865 e fechou seus olhos para sempre a 14 de fevereiro de 1938, no Rio, dois anos antes do Ministério da Aeronáutica lançar seu livro na coleção oficial, em 1940, pela editora Americana.
A publicação desta edição fac-similar de ‘Aspectos Norte-Riograndenses’ pelo Sebo Vermelho, do editor Abimael Silva, é um grande sol que nasce depois da longa noite de 104 anos que apagou a presença de Domingos Barros. Esquecido das nossas instituições culturais ao longo de mais de um século sem nunca merecer uma réstia de luz sobre o seu rosto, deixa agora de ser o herói desaparecido e anônimo a vagar no silêncio da noite sem fim para brilhar de novo com a velha chama do seu talento luminoso que anteviu o futuro de um Rio Grande do Norte que ninguém percebia.    

2012, nos cajus perfumados do verão.

Vicente Serejo